Cartola e Carlos Cachaça
A sede da
escola fica em frente a um lajedo que atualmente é a Associação dos Moradores
do Morro, da qual, sou um dos Fundadores.
Outra
vez, eu, Cartola e Carlos Cachaça, ficamos sentados uma tarde toda, no "botequim
da dona Joaquina". Foi quando Cartola fez, brincando, a seguinte
letra:
“Pouco
importa que me trate com desprezo.
Que me negues amor, carinho, beijo.
Pouco importa, porque, somente você...”
Não sei
se coloquei uma vírgula, ou acrescentei uma palavra... Não lembro bem... Só sei
que depois desse dia, o Cartola passou a me chamar de “parceiro”, em tom
de brincadeira.
Passamos
a tarde jogando conversa fora e tomando cerveja preta. Foi uma tarde muito
agradável!
Quando
Roberto Paulino resolveu unir vários mangueirenses que se encontravam afastados,
Sinhozinho, eu e o Roberto, visitamos várias pessoas, e entre elas, estavam
Cartola e o sr. Juvenal Lopes.
O Cartola
foi sempre uma pessoa vaidosa, sentia-se satisfeito em participar da nova fase
da escola e fez um samba enredo muito bonito, apesar de não ter sido o samba
escolhido para desfilarmos, pela dificuldade da nossa bateria em se enquadrar
no ritmo.
Para
felicidade dos outros concorrentes, inclusive o Cícero que estava na
expectativa do lançamento público do samba.
Cartola
reuniu algumas pastoras para aprenderem a interpretar o samba, como era feito
anteriormente pelo próprio Cartola, quando participava do concurso de samba
enredo. Foi aí que eu vi, o quanto ele entendia de direção para gravar.
A Neide (porta-bandeira),
fazia parte do grupo de pastoras e estava cantando o samba, quando Cartola
passou a exigir mais sentimento e dizia que no samba haviam trechos que se
deveria cantar como se estivesse com raiva, com tristeza, e outros, com
alegria.
Fazendo
ele mesmo as demonstrações necessárias e dividindo os trechos com raiva,
tristeza e alegria. E a partir daí, ele passou a cobrar.
Certo
dia, o Cartola nos acompanhava ao violão, neste dia aprendi mais um pouco sobre
a “venda” da “Divina Dama” para o
cantor Francisco Alves.
Dizia-me
ele, que o “Chico” (Francisco Alves), morava na Rua Jorge
Rudge e gostava de ficar sentado na varanda da casa e o Cartola, estava “duro”
sem dinheiro e sabia do interesse que Francisco Alves tinha em comprar a “Divina
Dama”.
O que ele
fazia? Ficava de tocaia prestando atenção para ver quando o “Chico” ia para a
varanda e disfarçadamente, passava em frente à casa dele, que ao vê-lo, o
chamava para conversar.
Cartola
aproveitava se queixando, falando de suas dificuldades... Lamentava mesmo. Mas
o Francisco Alves era muito seguro e não emprestava, nem dava dinheiro assim.
Disfarçando
e querendo ajudar o amigo, "Chico" chamava a governanta e determinava
para que ela desse algum dinheiro ao Cartola e recomendava: - "era ela que
estava compadecida dele". Cartola não podia saber que era ele, o “Chico”,
que estava dando a ajuda.
E assim,
ele fez algumas vezes, até que o Cartola acabou vendendo mesmo a “Divina
Dama”. Se não me engano, por dois mil réis, sem cobrar mais nada. Só exigia
que seu nome fosse conservado como "autor da obra".
Foi-me
contado pelo Cartola, que uma das vezes que foi procurado pelo Ciro Monteiro,
Aracy de Almeida e outros, ele não estava a fim de conversar com ninguém e se
escondeu, se trancando em seu barraco.
Lá pelas
tantas, um moleque gritou: - “Seu Cartola! tem umas pessoas lhe procurando!” e
disse os nomes. Cartola pensando que o garoto estava sozinho, gritou: - “Diga a
eles que eu não estou!”. Foi quando Ciro Monteiro gritou do lado de fora: -
“Sou eu, Cartola!” e ele, sem jeito, saiu para atendê-los.
No início
da "Bossa Nova", Cartola era muito procurado por
simpatizantes e cantores do novo estilo, talvez pelo seu jeito de tocar,
sua maneira de cantar, ou, seu estilo de compor... Só sei, que ele era muito
procurado.
Passando
por ele na rua, quando estava saindo do Buraco Quente e entrando na visconde de
Niterói, em tom de brincadeira, falei: - "Você parece
o "Papa" dessa nova modalidade de cantar! Todos procuram
por você!"
Ele deu
uma parada e voltando-se pra mim, com seu jeito calmo de falar, disse
sorrindo: - "Bossa nova que nada... Pra mim, é "bossa velha!"
Sempre toquei e cantei assim!".
Continuou a andar, e eu segui o meu caminho, sorrindo...
Continuou a andar, e eu segui o meu caminho, sorrindo...
CARTOLA DO MEU CONVÍVIO